segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Das histórias do seu Zé e seu Bezerra


Cinco e meia e o sol nasceu
levantou-se da cama José
E rezou com muita fé
pelo seu Bezerra que morreu.

Seu Bezerra homem valente
mesmo que não fosse seu avô
Cairia em prantos e chororô
parecendo menino carente.

Decidiu ir trabalhar
como diariamente seu costume
Mesmo recordando
de seu avô homem ilustre.

Meio dia no almoço
de novo aquele alvoroço
Lebrou-se de um sorriso doce
Do seu Bezerra que Deus trouxe.

domingo, 6 de novembro de 2011

Maio de 1964,
Confesso que estive passando por um péssimo momento nessas últimas semanas. Confesso que a perda do meu emprego me fez perder também a cabeça.
Comecei a tratar mal minha recém esposa a qual lhe tinha muito apreço, muito carinho. Nunca antes havia se quer levantado a voz à ela para discutir sobre alguma opinião pessoal divergente.
Passei a gritar com ela. Passei a me irritar com as mínimas coisas, até mesmo com a sua voz. Sua risada me fazia doer os ouvidos. Por vezes imaginava minha cabeça sangrando de dentro para fora pelos ouvidos.
Tínhamos uma bela horta no quintal de casa, alguns pássaros viviam em nossa macieira e decidimos “adotá-los”, demos até nomes a eles. Benjanim, Guilherme, Marcos, Patricia e Debby. Tínhamos também um cãozinho chamado, clichermente, Rex.
Não sei porque razão, talvez causas e consequências, estímulos e respostas, uma noite decidi queimar toda a horta, no que em alguns minutos o fogo tomou conta também de nossa macieira. Estava eu insandecido, estava fora de mim. Por algum momento creio que sorri por aquele show pirotécnico que comecei.
Nosso cão, Rex, avisou minha esposa com latidos intermináveis. Ela acordou desesperada, gritando e jogando mínimas porções de água de uma chaleira. E eu parado, assistindo a tudo, estoicamente.
Quando tudo queimou e só as cinzas se espalhavam no ar, algumas horas depois, acordei em minha cama completamente nu. Minha esposa estava na cozinha fazendo o café da manhã. Percebi sua tristeza, percebi suas bochechas molhadas de lágrimas e seus olhos mareados.
Perguntei-lhe: - O que houve?
Ela respondeu: - Você não lembra? Nosso quintal pegou fogo, misteriosamente.
Continuei: - Onde eu estava?
Ela: Você estava bêbado, não conseguia conter um riso cínico, achei melhor dar um chá de camomila com um comprimido para você dormir.
Ora, novamente confesso, eu não estava bem, realmente não estava bem psicologicamente e isso estava me afetando fisicamente. Não só a mim, mas a minha casa e a minha esposa.
Decidi sair para procurar um novo emprego.
Nove horas depois, por volta das 23 horas cheguei em casa novamente, muito bêbado. Rex começou a latir para mim, como se não me conhecesse. Quis avançar, minha única defesa foi bater em sua cabeça com a mala que eu estava em mãos.
Eu não tinha noção da proporção da força com que havia batido, estava escuro e eu estava bêbado. Notei que ele caiu e se aquietou, deitei no sofá da sala e dormi.
Acordei com minha mulher gritando e chorando dizendo que nosso cãozinho havia morrido. Alguma coisa havia atingido sua cabeça, ou ele mesmo havia cabeçado alguma estrutura ponteaguda a qual perfurou-lhe o cérebro profundamente.
A sala estava ensanguentada. Nosso carpete que era branco estava vermelho como uma garrafa de vinho tinto.
Corri para esconder minha mala, não queria que ela descobrisse que havia sido eu. Logo eu, que amava aquele cão e amava aquela mulher que também amava aquele cão.
Não consegui, ela já havia visto a mala. Ela me disse que estava tudo bem. Que provavelmente eu tinha um bom motivo e que ela entenderia se eu lhe contasse.
A sua docibilidade e amabilidade me comoveram. Contei-lhe que Rex havia avançado em mim, e minha única defesa foi a mala em sua cabeça. Eu não sabia que tinha sido tão grave.
Ela levantou-se e me pediu para ajudá-la a enterrar o Rex no quintal. Depois de enterrarmos e passarmos algum tempo contemplando seu túmulo retornamos à cozinha onde ela me fez um belo café da manhã.
Comecei a pensar: Nossa, não mereço esta bela, doce e compreensível mulher.
Decidi então abandoná-la, sair a noite para nunca mais voltar. Quando estava escrevendo-lhe uma carta senti sua mão em meu ombro e dizendo: - É isto mesmo que você quer?
Respondi: - É isso o que preciso fazer.
Ela disse: - Não gostaria que você se fosse.
Respondi amargamente: - Se eu não for, acabo matando você. Esse é o meu segundo maior desejo nessas últimas semanas.
Saí, bati a porta. Ela veio atrás de mim, tentou me segurar no meio da rua. Dei-lhe um soco, dois, três, quando ela caiu no chão lhe chutei as costelas, sua cabeça, e quanto mais ela chorava me pedindo para parar, mais eu queria bater até ela se calar. Bati, e bati e bati mais ainda, até que ela se calou.
Saí caminhando, acendi um cigarro, e assobiando fui descendo a rua com a consciência tranquila de quem não tinha feito nada mais que o correto.